sábado, 24 de janeiro de 2009

um grupo, não. uma equipa.


e agora que estreámos... emotiva e poeticamente...

a todas e todos: muito obrigada!!!


do Livro de Resumos do

I Congresso Internacional de Promoção da Leitura:

Formar Leitores para Ler o Mundo

por Gisela Cañamero


UM LUGAR IMENSO, TALVEZ.

talvez seja um lugar brilhante, azul - como diz a Ana.

encontrei a Ana - e quarenta outras almas – mulheres, homens e os seus filhos - que, desde há, pelo menos, três anos, cultivam este hábito, estranho à voracidade e imediatismo dos dias que correm, de fazerem da leitura partilhada um espaço de uma viagem comum na Biblioteca Municipal de Beja – quando me foi lançado este desafio, por parte da CASA DA LEITURA/FCG, de plasmar em acto performativo o sentir comum desta experiência iniciática.

começámos, em Outubro de 2008, uma caminhada conjunta cujo destino final desconhecíamos, pois, como diz a Paula: tem princípio e não tem fim: é um caminho – remetendo-nos para a, neste contexto, tão certeira frase de Machado: “caminante no hay camino, se hace camino al andar”.

os desvios experimentais deste caminho passaram a rotina - e foi derrubado o obstáculo mais temido: o medo.

o medo de não se ser capaz: de não conseguir criar – movimento, palavras, sonoridades, relação cinestésica ou dramática com o outro – de não se conseguir expor, na totalidade do seu corpo criativo e expressivo, ao olhar de terceiros.

portanto, quando o Pedro refere que este é o espaço onde superamos os nossos medos, soube que entráramos, finalmente, no espaço íntimo interior e imóvel: fora do tempo e do espaço físicos, como diz o Manuel, e onde as palavras ganham forma, onde tudo pode acontecer, como escreve a Laura.

manuseámos este objecto: o livro – muitos livros – sentindo, por um lado, a sua carga histórica e civilizacional e, pelo outro, a presença enérgica com que nos chega, hoje, às mãos, numa travessia milenária em formato imutável, em desafio à revolução tecnológica dos nossos dias: uma capa de papel mais ou menos cartonado, páginas agrupadas - cosidas ou coladas em lombada - onde podemos aceder, em silêncio interior, a outras vozes.

por isso a Leonor define este espaço como um sítio com muitas palavras que voam e que têm asas, mas são muito silenciosas.

esta dimensão do silêncio – que permite, antes de mais, a escuta interior à ideiação, à repescagem de memórias e a distensão necessária à sua associação divergente – ficou, desde logo, nos espaços de inusitadas improvisações*, relacionada com a tranquilidade interior, com a percepção da intemporalidade e da ausência de fronteiras espaciais, e com a aceitação do desconhecido, do que é mistério – como o definem a Cristina: um lugar de calma grande, a Céu: um espaço misterioso, sem limites, onde as letras andam à solta, a Joana: um lugar gigante, luminoso, ou a Cármen: um lugar onde o relógio pára, onde nos sentimos como pássaros a voar.

para a construção deste espaço de evasão, de alegria, de paz interior - como refere a Elisabete - a poesia, pelas suas múltiplas possibilidades significantes, rítmicas e oníricas – um sítio maravilhoso, mágico, como retrata um outro Manuel, e onde os sonhos se realizam, como diz a Marta - impôs-se muito cedo; e, nela, fixámo-nos nos extraordinários textos de Álvaro Magalhães.

com a vivência literária anichada, na música, nos olhares, nos movimentos, nos gestos, entrámos, aos poucos, no lugar onde o corpo e a alma se fundem num imenso bailado de palavras e emoções, como sublinha a Alexandra.

mas, neste turbilhão criativo, a intensidade do silêncio é fulcral para o acolhimento da sonoridade do timbre da palavra; possamos assim revisitar, sempre, este lugar maravilhoso, onde sonhamos até nos perdermos e depois podemos reencontrarmo-nos, sentindo o ar que respiramos, como, numa reflexão essencial, pressente o Vasco.**





*onde cruzámos improvisações feitas, por exemplo, a partir da corporalização dos nomes próprios de cada um com poemas de Eugénio de Andrade, de A Arte da Guerra, de Sun Tzu, com poemas de Álvaro de Magalhães, e os poemas deste com derivações jogadas e brincadas de modo aleatório, azaroso, e, de novo, a sua reinterpretação corporal, à construção de textos, ao desenho de personagens fantásticos, à sua interpretação dramática…


** o Vasco tem nove anos. a Marta, seis. o outro Manuel, sete. a Leonor e o Pedro, onze. a Laura, quinze. todos os outros nomes aqui citados, são, igualmente, papa-livros – Pais e Filhos participantes nos Clubes de Leitura de Beja; as suas definições de UM LUGAR IMENSO, TALVEZ, são a melhor aferição de um processo experimental e partilhado, que vale, apenas, por si.

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